Instruções de Meditação de Düdjom Rinpoche
Esta é a transcrição de um vídeo em que Kyabje Düdjom Rinpoche oferece ensinamentos sobre meditação. O vídeo foi feito por Sogyal Rinpoche, em maio de 1979 em Richmond, Londres.
“Por um lado, aquilo que chamamos de Dharma é muito difícil. Por outro lado é muito simples, porque de fato depende apenas da nossa própria mente.
Portanto, você deve buscar sua mente e cuidar dela.
Não deixe que a mente seja arrastada pelos pensamentos que surgirem.
Corte as elaborações e conceituações da mente e deixe-a relaxar em seu estado natural.
Deixe a mente simplesmente estar em seu corpo e permita que o relaxamento penetre a mente.
Como é esse estado de relaxamento? É como a experiência de uma pessoa que acabou de terminar um trabalho bastante exaustivo. Depois de trabalhar dura e longamente para cumprir sua missão, quando finalmente acaba, ela experimenta uma satisfação plena de felicidade e contenta-se em simplesmente descansar.
Muito naturalmente, a sua mente chega a um estado de calma e permanecerá relaxada por um tempo, sem ser aprisionada em seu padrão habitual de pensamentos descontrolados e inconcebíveis.
Então, seguindo esse exemplo, você deve tentar observar e proteger a mente, mesmo em meio a todo tipo de pensamentos turbulentos.
Deixe a mente em seu próprio estado natural e relaxe.
Mantenha o corpo imóvel e silencie a fala.
Não pense se deve ou não fazer isto ou aquilo.
Basta estabelecer a mente em um estado de relaxamento e tranquilidade, sem correr atrás de objetos e nem pensamentos descontrolados e loucos.
Em vez disso, permaneça em um estado vividamente aberto e vazio, brilhantemente claro e profundamente relaxado.
Esse estado de conforto é uma indicação de que a mente chegou a sua limpidez inerente e de que simplesmente se estabelecerá nessa lucidez.
Mas ela não permanecerá assim por muito tempo. Algo irá acontecer.
Surgirá um pensamento. Quando esse surgimento ocorrer, deixe a consciência reconhecê-la no mesmo instante. Não ache que algo está errado, apenas reconheça esse surgimento assim que ocorrer.
E apenas deixe tudo como está, com reconhecimento. Se a mente for apenas deixada em seu próprio estado natural, ela se pacificará e o surgimento de pensamentos naturalmente diminuirão, na medida em que você permita que se autoliberem.
São como ondas no oceano – elas retornam naturalmente de volta ao oceano, e este é de fato o único lugar para o qual elas podem ir.
O mesmo se dá com a nossa mente. Quando a partir de um estado de quietude ocorre um movimento, se o deixarmos simplesmente seguir seu próprio curso natural, ele será liberado por si só. A mente será naturalmente pacificada e se tornará límpida por si só.
É assim que se deve fazer esta prática. Mas se em vez disso você pensar “ai, agora este pensamento surgiu. Isso não deve estar certo!” e ficar tentando parar o pensamento, isso será apenas mais pensamento.
Praticar assim aumentará mais a sua própria confusão, pois a mente continuará seguindo mais objetos. Portanto, não pratique dessa forma.
Repousar no reconhecimento, sem seguir os pensamentos é conhecido como o calmo permanecer, porque dispersa ou pacifica o poder dos pensamentos e permite que você se mantenha na natureza de bem-aventurança da sua própria mente.
Isto é o que chamamos de shamatha em sânscrito ou shiné em tibetano.
Quando você se familiarizar um pouco com essa prática, pode ser que você experiencie um estado de êxtase ou de bem-aventurança física e mental, ou, se estiver meditando durante a noite, pode ser que experiencie um estado de clareza, como se o dia tivesse amanhecido. Experiências como essas podem ocorrer, e são sinais de que você está cultivando a paz e a calma de shamatha.
Não há nenhum problema em considerar essas experiências como positivas, mas seria um erro apegar-se a elas. Se você simplesmente permitir que ocorram, sem qualquer apego, elas servirão de apoio à sua prática e não causarão nenhum dano.
Assim, se qualquer experiência de felicidade ou de clareza ocorrer, não há necessidade de se agarrar a elas com apego, e tampouco de suprimi-las.
Simplesmente permita que se dissolvam naturalmente.
Você também pode ter o que é conhecido como uma experiência de “ausência de pensamento”. Este é um estado obscurecido, embotado e sonolento, em que não se tem consciência de coisa alguma. Você não está completamente adormecido, mas está embotado.
Essa experiência de ausência de pensamento é de fato um aspecto do calmo permanecer, mas não há pensamentos surgindo e a clareza inerente da mente não está presente. Isso é porque você deslizou para dentro de alaya – a base de tudo – e você precisará se dar conta e despertar. Para se afastar desse estado, endireite o corpo, exale o ar estagnado e concentre sua atenção no espaço à sua frente.
Porém, se ao invés disso, você permanecer nesse embotamento, sua meditação será ineficaz e você nunca avançará. Essa experiência de ausência de pensamento é uma falha na meditação e deve ser eliminada assim que ocorrer. Aguçar a consciência é também muito importante.
Praticar dessa maneira é o caminho para desenvolver o calmo permanecer.
Quando a mente está repousando naturalmente e à vontade em seu próprio estado inalterado, isso é chamado de quietude meditativa. Se a partir desse estado de quietude surgir um pensamento, isso é chamado de movimento, e aquilo que sabe quando a mente está em quietude e reconhece qualquer movimento é a consciência ou rigpa.
Estes são conhecidos coletivamente como gnas gyu rig gsum – os três estados de quietude, movimento e consciência.
Quando se é iniciante, a menos que você faça esta prática formalmente em sessões de meditação adequadas você não será capaz de permanecer em paz.
Mas quando se familiarizar com ela, você será capaz de permanecer sem se distrair, mesmo quando estiver andando por aí. E quando se sentar, você permanecerá sem se perder da consciência. Você deve aplicar esta prática a tudo que fizer e, assim, você se desenvolverá e avançará gradualmente.
Está bem?
Vamos fazer uma pequena meditação juntos?
PRECES
MEDITAÇÃO EM SILÊNCIO
Quando descansamos um pouco no estado natural dessa maneira, isso é chamado de equilíbrio meditativo. Isto é o que chamamos de “sessão formal de meditação”.
Então, quando saímos desse estado e retomamos todas as nossas atividades diárias normais, como caminhar, sentar, recitar orações ou mantras, e assim por diante, todas essas atividades fazem parte no período de “pós-meditação”.
Portanto, pós-meditação refere-se ao período que se segue depois de sairmos de um estado de equilíbrio meditativo formal.
Se você for capaz de manter a consciência do momento presente, sem perdê-lo durante todo o período pós-meditação, você obterá estabilidade em sua meditação formal rapidamente. Portanto você deve tentar sustentar essa consciência e não perdê-la.
Em equilíbrio meditativo, permitimos que a mente se estabeleça calmamente em sua própria natureza, como o oceano que não é perturbado pelo vento. Então, quando um pensamento surgir como uma expressão da energia da mente e ocorrer uma alteração, esse surgimento ocorre na própria mente. A distração mental é apenas uma movimentação ou uma mudança que ocorre dentro da mente. Quaisquer que sejam os pensamentos turbulentos que surgirem, se você permitir que a mente se estabeleça em sua própria natureza, eles se pacificarão, assim como as ondas retornam naturalmente ao mar. É assim que deve praticar em sua meditação formal.
No período pós-meditação, que inclui comer, dormir, passear, descansar, e assim por diante, você não deve se atirar a essas atividades como um coelho assustado. No momento em que a sua meditação formal terminar, levante-se lentamente e, a seguir, se precisar sair de casa, caminhe com o corpo relaxado e com mente à vontade.
Pouse o olhar levemente no chão, cerca de um metro à sua frente, (cerca da medida de um arado, se diz nos ensinamentos), e caminhe com calma, para que a sua mente não seja perturbada.
Mas se, em vez disso, você ficar caminhando sem rumo, balançando a cabeça de um lado para o outro, você ficará agitado. Assim, quando for caminhar, mova-se vagarosamente e de forma constante, dando passos lentos e olhando para o chão, cerca de um metro à sua frente. É assim que você deve caminhar.
Quando se sentar, não caia no chão como um saco de terra ou uma pedra pesada. Quando uma pedra está suspensa do chão e a corda que a sustenta é cortada, ela cai no chão com um baque. Em vez de sentar-se assim, devemos nos sentar lentamente e com calma.
Quanto à forma como você deve agir quando encontrar outras pessoas, se diz “Quando eu olhar para outro ser, possa o meu olhar ser sincero e pleno de amor”. Então, quando encontrar alguém, olhe para eles direta e sinceramente, a partir de um estado de calma natural. Ofereça a eles um olhar sincero e amoroso.
Se a sua mente for amorosa e você tiver cultivado a bodicita, seu olhar ganhará uma expressão particular e transmitirá uma atmosfera de paz e calma. Assim, quando se encontrar com outros seres, olhe para eles de forma franca e amorosa.
Quando falar, não tagarele qualquer coisa sem sentido que vier à sua mente. Fale de forma verdadeira e suave, de uma maneira adequada e agradável aos seus ouvintes.
Quando comer, não faça ruídos como uma vaca ruminando ou um cachorro devorando seu jantar. Coma e beba com calma e conscientemente, em um estado natural de relaxamento.
E quando for ao toalete, encontre um local adequado para fazer suas necessidades, que seja oculto de outras pessoas e longe de lugares onde as pessoas se reúnem e de locais sagrados, como templos.
Quando for dormir, deite-se com gentileza e de forma relaxada. Então faça orações ao seu mestre e às três jóias – o Buda, Dharma e Sangha. É assim que se adormece com a mente à vontade e em prece.
E então quando acordar, traga as três jóias e o seu mestre à sua mente de forma clara, e levante-se nesse estado de devoção. Desta forma, diz-se que a devoção despertará em sua mente, assim como você mesmo está despertando.
Em seguida, ao longo de todas as suas atividades diárias – caminhar, descansar, comer ou dormir – seu corpo deve estar relaxado. Você deve se mover calma e vagarosamente. Sua fala também deve ser calma, com o mínimo de palavras possível e ainda assim disciplinadas, prazerosas ao ouvido e agradáveis à mente.
Se agir dessa maneira, todas as suas atividades diárias estarão de acordo com os ensinamentos e, o mais importante, sua mente estará em harmonia com o Dharma. Aqui, neste contexto, Dharma significa domar a mente e pacificar todas as emoções perturbadoras.
PRECES FINAIS”
